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segunda-feira, 27 de maio de 2013

O fim da Escravidão e o processo de desumanização do negro no Brasil



Autores²: Alex Andrade, Jéssica Rayonara Nascimento, Karolayne de Souza Fernandes, Michael Hudson Dantas, Mora Kissi de Oliveira Nascimento, Priscila Augusta Silva de Carvalho.

Resumo: Esse trabalho tem como objeto de estudo a abolição da escravatura no Brasil, como objetivo um olhar critico para o fim da escravidão no Brasil. O método usado foi uma revisão textual em (DAMATTA, 1987), (LESSA, 2011), (MELLO, 1982), (JÚNIOR, 1987), e pesquisa em obras mais significativas, tais como (CARDOSO, 1962) e (FURTADO, 2009) para fundamentar nosso trabalho. O resultado foi a uma reflexão mais assídua: “Foi de fato, a abolição da Escravidão, à libertação para o negro, ou foi uma forma diferenciada de desumanização?”. Concluímos que houve uma libertação física, no entanto não houve a emancipação política, social e educacional do negro.

Palavras chaves: Abolição. Desumanização. Escravidão. Negro. Trabalho.

Introdução    
            O assunto tratado é a abolição da escravatura no Brasil com um olhar critico pretendendo ver a realidade em que se deparou o negro liberto sem condições mínimas de sobreviver dignamente.  A motivação é apresentar o presente artigo para avaliação da disciplina Formação Econômico, Social e Política do Brasil e para tanto decidimos abordar esse assunto com um ponto de vista diferenciado da forma como ele, geralmente, é tratado. A relevância do tema se torna pertinente, pois ajuda a compreender de modo crítico o processo de abolição do negro no Brasil. O artigo está estruturado assim: Um breve resumo do sistema escravista, os motivos econômicos que levaram ao fim da escravidão e as consequências. Em seguida salientamos a exclusão social e a desumanização que o negro sofreu, e concluímos reafirmando a forma de total exclusão social que este recém-liberto sofreu.
1. O escravismo no Brasil
            O momento em que se situa o escravismo no Brasil é o de terra colonial, onde a monarquia portuguesa tinha o objetivo de explorar a nova terra. Contudo, para explorar a terra, fez uso de mão de obra escrava oriundas dos tráficos negreiros que vieram da África. Afirma Caio Prado Junior (PRADO, 1987) que a metrópole (Portugal) tinha a pretensão de constituir uma colônia baseada em um regime agrário de grandes propriedades, com uma monocultura de exploração utilizando o trabalho escravo. Ou, como ele mesmo descreve a estrutura agrária (o mesmo pode-se dizer da economia escravista mineira) do Brasil colônia: são estes, em ultima análise, os fatores que vão determinar a estrutura agrária do Brasil colônia, os três caracteres apontados: a grande propriedade, monocultura e trabalho escravo, são formas que se combinam, se completam, e se derivam diretamente e como consequência necessária daqueles fatores.
Como vemos, a presença do sistema escravista era imprescindível para atender aos interesses da metrópole, e esse sistema vai perdurar por um bom período de tempo até que em 1888, pela assinatura da lei áurea, pela princesa Isabel, os escravos são libertos.  É evidente que vários fatos - tais como movimentos de revolta, constituição de quilombos, movimentos abolicionistas, intervenção de outros países para o fim do tráfico de escravo, entre outros - que envolvem o desenrolar da história do escravismo no Brasil, no entanto, nossa pretensão é de focar o como se deu esse fim face à necessidade econômica e política que acontecia no mundo de então (a saber, a necessidade de expansão do capitalismo mundial inclusive pelas terras do novo mundo) e seus desdobramentos.
2. Fim do escravismo: humanização ou desumanização do negro?
Conforme já citado houve vários eventos que permearam o processo histórico do escravismo no Brasil, entre eles estão os que cooperaram para o fim do escravismo, no entanto, nossa abordagem, será numa perspectiva econômico-social e nos deteremos a expô-los na construção do nosso texto. Conforme João Manuel Cardoso de Mello os custos da indústria escravista eram superiores aos da indústria capitalista o que tornava inviável a manutenção do escravismo diante dos avanços do capitalismo no mundo. De uma forma mais prática sairia muito mais em conta pagar o salário de um operário do que sustentar um escravo, pois na produção o operário conseguia desenvolver melhor seu trabalho, gerando consequentemente mais lucro para seu patrão, já o escravo não, por que seu sistema de trabalho não estava inserido dentro da lógica capitalista. Cardoso, em sua obra Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional, afirma que:

O sistema escravocrata por condições inerentes a si mesmo, constituía um obstáculo para o desenvolvimento das forças produtivas do modo capitalista de produção. Vemos que a necessidade do fim do escravismo se dava por várias questões, mas as questões de ordem econômica suplantavam as demais (CARDOSO 1962. p 203).

 A produção da indústria capitalista dos países europeus avançava na dimensão de suas unidades, gerando economias de escala cada vez mais significativas, já a produção do sistema escravista estava estagnada pela sua própria inércia. João Manuel Cardoso de Melo (1986) diz que “o sistema escravista era incapaz de suportar a concorrência da indústria capitalista dos países centrais”. (MELLO, 1982, p.)
            Outro ponto a ser levado em consideração de ordem política e econômica foi a abolição do tráfico internacional de escravos promovido pela principal potencia econômica capitalista da época, a Inglaterra, que estava vivenciando o auge da revolução industrial, e necessitava expandir seu mercado, comercializando direto com o Brasil que ainda era colônia de Portugal. Uma das imposições da Inglaterra era a abolição do tráfico de escravos, e isso tornou cada vez mais caro a manutenção desse sistema (escravocrata), pois não havia mais tantos escravos disponíveis para suprir as demandas escravocratas. Outro fator de ordem econômica, posto por João Manuel Cardoso de Mello (1982), era o fato de que a mão de obra escrava não tinha uma divisão técnica do trabalho, dada por sua própria condição:

A escravidão bloqueava tanto uma maior divisão técnica do trabalho, quanto a especialização do escravo, porque era próprio de sua condição que se mantivesse res. A produtividade do trabalhador assalariado, [...] utilização da capacidade produtiva e preços, haveria de ser muito maior... (MELO, 1982, p. 75).

Vemos que fica evidente que a questão econômica para o fim do escravismo teve um imenso peso condicionante para tal.
3. A abolição da escravatura e suas consequências
Como é sabido, em 1888 por intermédio da lei Áurea, é decretado o fim da escravidão no Brasil. Mas, como é sabido também, esse fato é amplamente divulgado como um evento do fim do sofrimento da raça negra no Brasil. De fato não deixa de ser um elemento positivo, entretanto, o fim da escravidão é o início do processo de marginalização e desumanização do negro, pois esse acontecimento foi muito mais prejudicial a esse (negro) do que para o próprio senhor de escravo. Com os escravos libertos surge no cenário Brasileiro uma grande massa de negros livres sem perspectiva nenhuma de futuro; estavam dissociados socialmente e economicamente do resto da população. A lei Áurea proveu o fim da escravidão, mas não o inicio da dignidade e humanização do negro brasileiro.
A grande questão que se levanta é como os negros, agora libertos, não têm os meios de produção, não possuem terras para habitar e sem nenhuma perspectiva, iriam se refazer como seres humanos. Foram lançados ao destino cruel, ao amanha incerto. Observando a realidade social dos recém-libertos, eles não eram nem possuidores dos meios de produção nem tão pouco mão de obra disponível, eram simplesmente negros livres que foram destituídos de sua condição escrava pra uma condição social indefinível para humanos, saíram da realidade escrava para uma realidade que não lhes cabia.
Da Matta (1987) ao citar Marx diz que "os homens fazem a sua própria historia, mas não a fazem como querem; sobre as circunstancias de suas escolhas, e sim sobre aquelas que se defrontam".
Os negros sentiram extrema dificuldade em sobreviver em uma sociedade que estava surgindo, sociedade essa que eles não tinham espaço, pelo fato de nunca terem sido preparados para a emancipação política que passaram a vivenciar. Em outras palavras, os ex-escravos estavam diante de uma condição política que lhe davam o direito a liberdade de seu senhor, no entanto, estavam engendrados a uma realidade social que os desumanizavam e os degradavam, pois, sem acesso ao trabalho, o que na visão marxista, é a condição que o homem precisa para se realizar como indivíduo.
3.1 Exclusão social
De acordo com Marx, a sociedade divide-se em duas classes (exploradora e explorada), no entanto, ao libertarem-se, os negros ficaram marginalizados nessa divisão social, não se encaixavam em nenhuma destas classes, pois ao mesmo tempo em que eles se encontravam livres, encontravam-se segregados de uma sociedade a qual não lhes dava oportunidades de exercer essa liberdade de modo que eles pudessem trabalhar dignamente e viver da forma que lhes condicionassem oportunidade de escolha na nova vida. É fato de que de em toda sua história, não tiveram nenhuma educação ou qualificação profissional. Portanto, podemos entender que não era de interesse daqueles que detinham o poder econômico e político proporcionarem-lhes não só a emancipação política, mas econômica e social. De acordo com Cardoso (1962), os negros foram tão alienados durante o processo de escravidão que ao serem libertos tiveram que passar por um processo de ociosidade social para se reconstruir como indivíduo. Nas palavras do autor:

O processo alienador da sociedade escravocrata havia contaminado de tal forma a consciência e o sentido das ações humanas, que o trabalho aparecia como a qualidade anti-humana por excelência, sendo necessário, por isso, que o homem negro se afirmasse primeiro como ocioso, para sentir-se livre e poder recomeçar todo o caminho da lenta e penosa reconstrução de si na sociedade de classes que começava a formar-se. (CARDOSO, 1962, p. 279).

            Esse estado de classe alienada, ainda escrava, para o negro, mostra quão era insuficiente somente a liberdade, mas também condições sociais, educacionais, e econômicas para poder viver nessa nova realidade que foi lançada.
            A exclusão, na nova lógica que se implantava (a transição para o sistema de produção capitalista), era inevitável para o negro, pois sem nenhum aprimoramento técnico sem nenhuma educação funcional não estavam, em sua maioria, para servir de mão de obra para o capitalismo. Cardoso de Melo diz que: “o escravo enquanto escravo é incapaz de manejar, ‘produtivamente’ técnicas que impliquem no emprego de máquinas” (MELLO, 1986, p.60), o que os torna incapazes de se inserir nos moldes dos modos de produção que se encaminhava a nação.
            A nova condição de livre imposta ao negro o introduzia numa nova realidade de classe social fora do sistema econômico de produção e, sem trabalho, era desumanizado não só pelos anos de exploração que sofreram, mas por não terem as mínimas condições econômicas e sociais para se realizarem.  Sérgio Lessa citando Marx diz que:

Por meio do trabalho que os homens não apenas constroem materialmente a sociedade, como também lançam as bases para que se construam como indivíduos. A partir do trabalho, o ser humano se faz diferente da natureza, se faz um autentico ser social com leis de desenvolvimento histórico completamente distinta das leis que regem os processos naturais. (LESSA, 2011 p. 17).

 Celso Furtado, em seu livro Formação Econômica do Brasil, diz que alguns negros, escravos da região cafeeira, tiveram o privilégio de trabalhar por salários relativamente altos, só que o autor reconhece que o livre não estava preparado para o tipo de trabalho assalariado. Furtado diz que os efeitos dessa tentativa de trabalho assalariado fora antes negativas do que positivas. Em suas palavras ele diz:

O homem formado dentro desse sistema colonial está totalmente desaparelhado para responder aos estímulos econômicos. Quase não possuindo hábitos de vida familiar, a ideia de acumulação de riqueza é praticamente estranha. [...] Sendo o trabalho para o escravo uma maldição e o ócio o bem inalcançável, a elevação do seu salário acima de suas necessidades [...] determina de imediato a forte preferência pelo ócio. (FURTADO, 2009 p. 212).
               
Como vemos na abordagem de Furtado o negro estava limitado pelas agruras da escravidão que o limitou não só no seu direito de liberdade física, mas também econômica educacional e social, pois mesmo com a oportunidade de trabalho assalariado para alguns não se adaptaram a esse sistema de produção, preferiram o ócio ao trabalho.
 Cardoso (1962) diz que alguns negros tiveram acesso ao trabalho nas mesmas condições do antigo regime (escravista), mas agora com nome de “livre”. Não lhes estavam reservado direito algum, somente a escolha de se submeter às antigas condições.

Com efeito, o nego livre tinha que optar entre continuar trabalhando nas mesmas condições que antes, com status formal de cidadão, ou reagir a tudo que o trabalho desqualificado pela escravidão, significava, passando a viver na ociosidade e no desregramento. Foi essa a alternativa; que os brancos criaram para os negros. (CARDOSO 1962, p.279)
            O autor diz que foi necessário passar pelo estágio de ociosidade para poder superar as dificuldades que encontraram para se moldar profissionalmente e educacionalmente a nova realidade, e isto lhes rendeu a alcunha de que todo negro é ocioso, não gosta do trabalho.
Por outro lado Furtado (2009) diz que: “Na região nordestina as terras de utilização agrícola mais fácil já estavam ocupadas praticamente em sua totalidade á época da abolição. Os escravos liberados que abandonaram os engenhos encontraram grandes dificuldades para sobreviver”. Aqui vemos que os escravos da região nordestina não tiveram a mesma “sorte” que os da região cafeeira, pois foram abandonados rumo ao destino incerto de escolha, abandonados a sua continua desumanização.
Conclusão:
            Como foi observado nas proposições expostas acima, vemos que com um olhar mais critico no processo de abolição a escravatura do Brasil há um desencantamento de todo o vislumbre que se coloca na libertação dos escravos, isso se dá porque era necessário mais do que uma simples libertação física, era imprescindível que o negro recém-liberto tivesse emancipação econômica, emancipação social, e emancipação educacional para o novo mundo que lhes foi descortinado. A falta desses elementos supracitados culminou em uma forma de desumanização diferente à que ele era submetido enquanto escravo. Nesta, enquanto escravo, mesmo de forma precária, ele trabalhava, comia, se vestia etc.. Na outra, foram excluídos totalmente das classes, eram apenas negros.
Referencias:
CARDOSO, Fernando Henrique. Capitalismo e Escravidão No Brasil Meridional: o Negro na Sociedade Escravocrata do Rio Grande do Sul. São Paulo: DEL, 1962.
DAMATTA, Roberto. Relativizando: Uma Introdução à Antropologia Social. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. Edição comemorativa: 50 anos. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
LESSA, Sérgio; TONET, Ivo. Introdução à Filosofia de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011. Disponível em <http://sergiolessa.com/Livros2012/intrfilmarx2ed.pdf> . Acesso em 03 de março de 2013.
MELLO, João Manuel Cardoso de. O Capitalismo Tardio. 2 ed. São Paulo: Brasiliense, 1982.
PRADO JÚNIOR, Caio.Formação do Brasil contemporâneo:colônia. 8. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
 

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